1973
Itália
PublicaçãoIdiomas disponíveis
Português
Marcadores
Planejamento Urbano
Colaborador
Leandro Cruz/ Thais Portela
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O livro foi o resultado, segundo o próprio autor, de uma "reelaboração" e de uma "considerável ampliação" do ensaio Per uma critica dell'ideologia architettonica, publicado na edição 1/69 (jan./abr. 1969) da Contropiano - revista marxista italiana fundada em 1968. Para ele também concorreu, entre outras influências, um outro artigo para a mesma revista, publicado no ano seguinte, Lavoro intelletuale e sviluppo capitalistico - sobretudo para o terceiro capítulo. A tese central de "Projeto e utopia" sustenta que desde o Iluminismo a arquitetura tem sido um instrumento ideológico do capitalismo, por isso não há como ela ser "revolucionária" como assim queriam os modernos.
As proposições de Tafuri no livro tiveram grande influência para os debates sobre a arquitetura moderna, bem como sobre o posicionamento crítico com relação à produção contemporânea. Alguns trechos do livro foram republicados nas coletâneas organizadas por Kate Nesbitt (A new agenda for architecture, de 1996) e por Charles Jencks e Karl Kropf (Theories and manifestoes of contemporary architecture, de 1997). Já o artigo de 1969 para a Contropiano foi republicado nas coletâneas organizadas por Michael Hays (Architecture theory since 1968, em 1998) e por Harry Francis Mallgrave e Christina Contandriopoulos (Architectural theory. Volume II - an anthology from 1871-2005, de 2008).
Manfredo Tafuri, 1973:
"Pode até acontecer que existam muitas tarefas específicas para a arquitectura. A nós interessa sobretudo saber porque é que até hoje a cultura de inspiração marxista, com extremo cuidado e com uma obstinação digna de melhor causa, nunca negou ou encobriu culposamente esta simples verdade: que, tal como não pode existir uma Economia política de classe, mas uma crítica de classe à Economia política, também não é possível criar uma estética, uma arte, uma arquitectura de classe, mas apenas uma crítica de classe à estética, à arte, à arquitectura, à cidade.
Uma crítica marxista coerente da ideologia arquitectónica e urbanística apenas pode desmistificar realidades contingentes e históricas, de modo algum objectivas ou universais, que se ocupam por detrás das categorias unificantes dos termos arte, arquitectura, cidade: reconhecendo outrossim os novos níveis atingidos pelo desenvolvimento capitalista, e com os quais os movimentos de classe são chamados a confrontar-se."
Kenneth Frampton, 1980:
"[...] Hoje, a prática da arquitetura mergulha no ‘silêncio' - ver ‘Progetto e utopia' [Projeto e utopia] de Manfredo Tafuri, de 1973 -, e mesmo em desprestígio, somente porque um dos temas fundamentais sobre os quais deveria manifestar-se, o destino da sociedade, é-lhe continuamente negado. Infelizmente, as instituições políticas que seriam capazes de rearticular essa forma específica de significado são hoje tão frágeis quanto a cultura da própria arquitetura."
Ignasi de Solà-Morales Rubió, 1985:
"Desde os anos 1960 vem ocorrendo um desmascaramento das ilusões de uma história ideológica que não apenas parece ter tendido a disseminar a ansiedade do presente quanto a justificar as suas escolhas. Essa história não pode mais se aferrar a uma pretensão de veracidade. Não há nenhum fio condutor ligando o passado ao presente. Manfredo Tafuri, o mais importante pensador da natureza holística do ciclo da história da arquitetura na era moderna, construiu um modelo tão eficiente quanto tautológico no que diz respeito à representação da passagem do tempo histórico. [...]
A idéia de que a arquitetura e os arquitetos a um só tempo produzem a sua afirmação e a sua negação, e, por conseguinte, o significado e a contradição de sua lógica, constitui não só uma hipótese central da obra de Tafuri, mas também o paradigma predominante na maior parte da historiografia recente da arquitetura."
Kate Nesbitt, 1996:
"Propondo-se fazer uma ‘desmistificação da realidade' coerente com o marxismo, Tafuri conclui que a arquitetura moderna tentou resolver problemas que estavam além do seu alcance enquanto disciplina. Opinião que é corrente nas numerosas teorias pós-modernas, especialmente no que diz respeito ao minucioso programa da arquitetura para o progresso geral da sociedade. Diane Ghirardo observou que alguns pós-modernistas usam o fracasso do ultra-ambicioso programa do modernismo para justificar o abandono do social em troca do formalismo [...]. Parece, portanto, que Tafuri defende uma definição mais estreita dos problemas da arquitetura. Suas idéias se opõem diretamente às de Robert Venturi em Complexidade e contradição, que afirma que a arquitetura moderna conseguiu uma pureza (tediosa) de expressão pela exclusão de seu campo de ação de muitos problemas legítimos [...]
O ceticismo radical de Tafuri quanto às possibilidades de uma arquitetura crítica (‘de classe'), ou mesmo de uma imagem para uma ‘arquitetura de classe', impede-o de prescrever uma metodologia específica para o exercício da disciplina. [...]"
K. Michael Hays, 1998:
"Tafuri [deu] um veredicto sobre a arquitetura contemporânea no seu ensaio de 1969, ‘Por uma crítica da ideologia arquitetônica'. Aqui ele formula toda a trajetória do modernismo - do Iluminismo até o presente (ele se recusava assiduamente a qualquer periodização de um pós-modernismo) - como um desenvolvimento unitário, no qual reconhece a eterna busca da arquitetura por sua vocação social, através de uma lógica intrínseca própria, como uma transfiguração da racionalidade do capitalismo na racionalidade da forma autônoma, uma hipotecagem da equidade social da arquitetura por um espaço cultural bem definido, abandonada em função do jogo formal. O esforço contemporâneo da arquitetura em voltar-se sobre si mesma, através de operações formais autônomas, alerta-nos não para o sucesso da arquitetura, mas para a sua derrota frente ao momento histórico, que deu fim a determinadas funções sociais que a arquitetura tinha desempenhado anteriormente."
Josep Maria Montaner, 2007:
"Em Projeto e utopia (1973) [Tafuri] constata o fracasso das vanguardas e reafirma o caráter da arquitetura como instrumento ideológico. A interpretação de Tafuri constitui um passo a mais na visão política da arquitetura difundida por Leonardo Benevolo.
Nesses anos [1960-70], Tafuri elaborou uma nova interpretação da história e da crítica, que consistiu numa síntese de muitas outras contribuições contemporâneas. Sem dúvida, Tafuri herda o espírito crítico de Walter Benjamin, associado à tradição marxista mais heterodoxa e ao mesmo tempo mais irredutível: Alberto Asor Rosa, Mario Tronti e Antonio Negri, todos aqueles que se negaram a dar apoio à produção capitalista, inclinando-se por um ponto de vista hipercrítico e negativo. [...]
A obra de Manfredo Tafuri encontrou continuidade na maioria de seus qualificados colaboradores do Departamento de História do Instituto Universitário de Arquitetura de Veneza, como Francesco Dal Co - com quem Tafuri escreveu Architettura contemporanea (1977) -, Mario Manieri Elia, Giorgio Ciucci e George Teyssot, além de autores os mais diversos, como Josep Quetglas, Beatriz Colomina, Micha Bandini, Michael Hays e Jorge F. Liernur."
Anthony Vidler, 2008:
"[...] [Para Tafuri,] a ‘arquitetura' - a totalidade de estruturas, sistemas, ideias e práticas que estão ligadas às obras concebidas e construídas pelos arquitetos - é uma ideologia. Ela tem seu lugar ao lado das leis, da religião e de todo restante, como uma mistificação da prática material. Com essa afirmação, escrita no prefácio da tradução para o inglês de Progetto e utopia, em 1976, Tafuri acreditou que evitaria as alegações subsequentes de que ele tinha produzido ‘uma profecia apocalíptica, ‘a expressão da renúncia' ', levando à ‘declaração definitiva da ‘morte da arquitetura' '. Para ele, considerando o posicionamento marxista do periódico Contropiano, tudo isso era evidente. Mas os leitores da área de arquitetura, deslocando o seu ensaio desse contexto, acharam simplesmente que ele era ‘contra' a arquitetura, pura e simplesmente.
[...] Naquele posicionamento de 1969, portanto, Tafuri não estava proclamando a morte da arquitetura, mas um reconhecimento consciente do papel ‘da arquitetura' enquanto ideologia, e com isso o reconhecimento do declínio desse papel, da sua crescente inutilidade para o desenvolvimento do capitalismo. O que o interessava não era um papel revolucionário para uma arquitetura nova ou radical, mas ‘a identificação precisa das tarefas que o desenvolvimento capitalista tinha removido da arquitetura'. O drama da arquitetura contemporânea, ao invés de estar localizado em sua busca por um novo papel ideológico, reformista, utópico, ou de desenvolvimento, estava em sua ‘inutilidade sublime', levando ao recurso da ‘forma sem utopia'."
Pier Vittorio Aureli, 2009:
"De acordo com Tafuri, a arquitetura moderna - especialmente em seus momentos de vanguarda - poderia ser caracterizada como as prefigurações ideológicas dos efeitos do desenvolvimento capitalista que estavam por vir. Sendo assim, a cultura arquitetônica modernista teve um papel preciso de naturalizar esses efeitos e de torná-los socialmente e culturalmente aceitáveis.
Quanto mais a cultura arquitetônica elevava o grau da experimentação radical, mais dos seus atributos culturais ela fornecia para o ciclo de desenvolvimento capitalista seguinte. Este é o círculo vicioso. E assim que um ciclo de experimentação era superado por um novo ciclo de desenvolvimento, os seus produtos arquitetônicos e urbanos eram abandonados como ‘forma sem utopia', significando uma forma desprovida de qualquer urgência reformista. [...]"